sexta-feira, agosto 11, 2006


Adeus a "Xabregas" Posted by Picasa
Fotografia oriunda do acervo do Museu Académico, datável de 1930-1931, com Jorge Alcino de Morais "Xabregas" (g), José Lopes Espírito Santos (voz) e José Alves de Oliveira (violão aço). Todos eles pertenceram ao Fado Académico de Coimbra, fundado em 1930. Merecem atenção a configuração clássica da Guitarra Toeira de Coimbra e o violão de cordas de aço com as ilhargas acentuadamente baixas (dito "o bacalhau"). José Monteiro Lopes do Espírito Santo (1908-1967), abandonou as cantorias e o FAC em 1932 para se dedicar com afinco aos estudos que o guindaram a lente da Faculdade de Medicina da UC. E Espírito Santo não foi o único sócio d FAC que ascendeu a lente, pois o cantor António Augusto Ferreira da Cruz também veio a integrar os quadros da Faculdade de Letras da UPorto (História)*.
Jorge Alcino de Morais nasceu em Samões, Concelho de Vila Flor, no ano de 1908, tendo falecido na cidade de Faro aos 22 dias de Setembro de 2004.
Orfão de pai, Xabregas viveu até aos cinco anos com familiares na cidade do Porto. Dos 5 aos 10 anos esteve radicado em Trás-os-Montes. Aos 10 anos de idade regressou ao Porto, cidade onde fez uma parte do secundário num colégio particular e outra no Liceu Rodrigues de Freitas até ao ano de 1925. Colega de serenatas e guitarradas de estudantes do Liceu do Porto como Carlos Leal e Amândio Marques, Xabregas e Amândio Marques seguiram para a UC em 1925. Xabregas foi cursar Físico-Química, curso que terminou quase 10 anos depois, em 1934. O seu amigo e guitarrista Amândio Marques (1903-1987) fez Direito entre 1925-1930, não tendo deixado nome nos anais da memória da CC.
Xabregas começou a tocar os primeiros acordes de guitarra em afinação natural ainda criança, por volta dos 9-10 anos, em Trás-os-Montes, para tanto usando uma guitarra pertencente a uma sua tia.
Na 2ª metade da década de 20 (dita "Década de Oiro"), Xabregas participou em incontáveis serenatas espontâneas, fez saraus em Coimbra, Portugal regional e Galiza, fundou o FAC (1930-1938) e acompanhou as grandes vedetas dos anos 20 e 30. Eis uma pequena amostra: Paulo de Sá, António Menano, Edmundo Bettencourt, Lucas Junot, Francisco Serrano Baptista, José Paradela de Oliveira, Artur Paredes, Armando Gois, Artur Almeida d'Eça, Alexandre Sá Carneiro, Felisberto Passos, Lucena Sampaio, José Espírito Santo, António Cruz, Albano de Noronha e Luís Providência e Costa (seu 2º guitarra).
Em 1929 Xabregas efectuou uma série de gravações (possivelmente para a Parlophone), com velhos amigos do Liceu do Porto, alguns dos quais frequentavam agora a UP, mas nenhuma das matrizes chegou a entrar no mercado discográfico. Aliás, Xabregas manteve-se sempre em ligação com os antigos colegas serenateiros da fase liceal portuense. Ainda de acordo com as declarações prestadas em 1989, quando o FAC viveu uma grave crise de cantores entre 1934-1938, Jorge Xabregas trazia a Coimbra e integrava nas digressões do seu grupo vozes ligadas à Academia do Porto. Testemunhos este teor ajudam, por exemplo, a fazer luz sobre a divulgação em Coimbra de uma peça como "À Meia Noite ao Luar", aí pelos anos de 1936-1937.
Na fase inicial de Coimbra, o reportório instrumental de Xabregas assentava em peças trazidas do meio académico portuense e nas composições divulgadas por Artur Paredes, como "Si Menor", "Balada de Coimbra" e "Fado Hilário". Xabregas inseria-se na facção dos guitarristas conimbricenses que criticavam abertamente Albano de Noronha, acusando-o de plagiar o estilo de Artur Paredes. Jorge Xabregas pertenceu à chamada "escola de transição" em termos de guitarra de Coimbra. Não plagiava abertamente Artur Paredes, e também já não praticava a afinação natural nem os toques antigos de 1ª e 2ª sem harmonizações. Seguia um estilo eclético que resultava da fusão de elementos herdados da Belle Époque e do Ultra-Romantismo, aqui e ali polvilhados de resíduos fadísticos (marcantes no tom de Ré Menor), com as novidades paredianas. Foi este o estilo que mais se impôs na década de 1940, para finalmente merecer as imprecações das formações lideradas por António Brojo e António Portugal.
Terminado o curso em 1934, Xabregas começou a leccionar no Liceu de Coimbra (1936-1939), manteve-se na direcção do FAC e matriculou-se em Medicina. Mobilizado para serviço militar em 1939, esteve na Figueira da Foz (1939-1940) e no Colégio Militar (Lisboa). No ano lectivo de 1940-1941, Jorge Xabregas seguiu para Angola. Foi professor e Reitor no Liceu de Nova Lisboa, cidade onde tocou frequentemente como Carlos Figueiredo na década de 1950 (Figueiredo chegou em 1953).
Regressado a Portugal, Xabregas ainda trabalhou como Reitor no Liceu de Sintra. Após a aposentação viveu em Oeiras e em Faro.
Jorge Xabregas deixou "Fado da Noite", popularizado por Camacho Vieira e gravado por Machado Soares, "Variações em Lá Menor" (gravações APortugal e OSérgio) e as inéditas "Variações em Sol".
Fontes: testemunhos prestados pelo biografado em 15/04/1989 (Coimbra) e 08/08/2001 (Faro)
Agradecimentos: Dr. José Mendes Morais
*Armando Luís de Carvalho Homem assinou uma boa notícia biográfico-académica sobre este historiador. Vide "António Cruz (1911-1989): um Testemunho", Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. História, II Série, VI, 1989, pp. 457-469. António Cruz não seria o único a "silenciar" no seu currículo o passado ligado a "fados e guitarradas". O lente da Faculdade de Direito da UC José Carlos Martins Moreira (1895-1977), executante de violão, que gravou discos com Paulo de Sá/Elísio de Matos, também omitiu do seu currículo qualquer suspeita de ligação à Galáxia Sonora Coimbra, preferindo valorizar a sua faceta de monárquico e a empatia que lhe merecia a ideologia hitleriana.
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